Curral Novo: memória quilombola em movimento

1 Comentários
Márcia Guena

Curral Novo, localizada a cerca de 20 quilômetros do centro de Juazeiro, consta na lista da Fundação Palmares como comunidade quilombola, assim como muitas outras localizadas às margens do Rio São Francisco, nesta área do submédio. Uma comunidade predominantemente negra, que inicialmente vivia às margens do riacho que banha a localidade, com o mesmo nome do Rio Salitre. A enchente de 1960 e constante perda de terras os deslocou para onde estão hoje.

Uma população predominantemente negra, com uma história de aproximadamente 150 anos de ocupação, se contar os anos a partir das memórias de dona Augustinha, hoje com 80 anos. A terra que ocupavam era vasta, até a chegada na região de um grande produtor de frutas, que agora planta manga para exportação, como relata Augustinha, declarando que os moradores passaram a trabalhar em suas terras. Ali nasceram seus pais e sua avó, parteira responsável pelo nascimento de muita gente da comunidade. Os moradores de Curral Novo preservam vários elementos de cultura negra na região, como o Samba de Veio, uma grande expressão musical e artística muito presente entre as comunidades negras quilombolas.






O caminho




Na altura de Campo dos Cavalos, entramos à direita por uma estrada de terra cheia de sulcos, ladeada por pequenos lugarejos, cada um com um nome distinto, inaugurando novas comunidades, novos bairros ou espalhando por outros espaços uma memória que vai se diluindo. Um sentimento de solidão paira na paisagem: uma terra seca, uma obra de irrigação também seca, bicicletas, sofás, portões velhos que compõem a paisagem, como se fossem plantas de ornamentação. Passamos por Capim de Raiz, outro nome da lista da Fundação Palmares, nossa próxima parada, e entramos em Curral Novo.





Um grande círculo de terra vermelha, com um campo de futebol no meio, rodeado por casas, muitas delas de taipa e outras tantas de tijolos. No meio um campo de futebol e uma caixa d´água da Codevasf, como se fosse uma torre de transmissão. Atrás desse grande círculo, uma vasta plantação verde e exuberante de manga, marca a diferença de tons:o vermelho pula para o verde sem gradações. Subimos na torre da Codevasf para fotografar o grande mar verde que transborda em contraste. “Aquilo tudo ali é do japonês, seu Paulo”, conta dona Augustinha, de 80 anos, que viu tudo ali se arrumar.



Vamos direto para a Escola Municipal Miguel Ângelo de Souza, cujo nome é uma homenagem ao seu fundador, um homem negro que deixou muitos parentes na localidade, inclusive dona Augustinha, sua sobrinha, e Hildete Francisca de Oliveira, secretária da escola, que, após aprovada em um concurso, coincidentemente, saiu de Juazeiro e foi trabalhar junto a parentes que não conhecia em Curral Novo, ou seja quase toda a comunidade. Um porteiro simpático pede que nos anunciemos na entrada da escola, o que já é bom sinal. A escola limpa e arejada, o telhado alto, as salas amplas e cuidadosamente decoradas com letras e desenhos. Fomos direto procurar Eliete, a responsável por muita coisa ali, inclusive pela administração da Escola, mas ela não estava.



Conversamos com Maria Aparecida Leite, sobrinha de dona Augustinha, que há pouco mais de um mês trabalha como merendeira da escola. Uma excelente função pra ela se for avaliada pelo arroz doce servido na merenda das crianças: delicioso. Assim como quase todos da comunidade, Maria nasceu em Curral Novo. Quando criança saía para pegar palha com seu pai  e desde adolescente trabalha nas roças vizinhas. A nossa principal entrevista nessa visita foi com dona Augustinha, que aos 80 anos exibe muita vitalidade e guarda uma parte importante das histórias de Curral Novo. Logo daremos continuidade a essa história.


(Visita realizada no dia 23 de maio de 2013)


Você também pode gostar

Um comentário: